domingo, 30 de junho de 2013

Oração ao amor

Há um fio de destino que me separa de você. Uma linha tênue entre o que sou e o que gostaria de ter sido para você, querido. Há em mim uma vontade maternal de ter sido o seu anjo da guarda, o enviado para você, para assistir sua jornada em direção à Terra. Gostaria de ter estudo para ter feito sua ultrassom e ouvir, pela primeira vez na vida, a batida do seu coração. Depois, puxá-lo do primeiro lar que essa vida te deu e ser a responsável por apresentar a você o nosso mundo, embora seu primeiro choro partisse meu coração. E aí desvanecer feito poeira, transformando-me em uma criatura imperceptível para, em silêncio, acompanhar seus primeiros dias em casa, feito papel de parede. Imóvel, enfeitando a sua visão diária e sendo seu castelo. Não há mal que me impeça de desejar ter sido seu primeiro Natal ou o pisca-pisca que brilhou seus olhos naquela noite. Eu queria ter sido o seu presente de aniversário, aquele que você esperou tanto, para, ao me desembrulhar, presenciar o seu olhar descrente de alegria e satisfação, seguido pelo sorriso da gratidão. Eu queria ter sido sua primeira bicicleta e ser a responsável por fazê-lo sentir o prazer do vento no rosto. Eu queria ter sido a primeira menina que fez o seu coração bater mais forte para introduzi-lo ao amor. Mas eu não queria ficar apenas na sua infância. Eu queria ser o travesseiro que abafou seu primeiro choro escondido, aquele que ouviu seus pensamentos mais dolorosos. Eu saberia te dar o conforto que precisava, eu sei que saberia! E que Deus me perdoe, mas eu gostaria de interceptá-lo para que nunca perdesse ninguém que te fizesse muita falta! Eu queria ter sido a inspiração para sua primeira composição e o seu time de futebol. Vê-lo me cantar ou gritar meu nome, vestir minha camisa e me encaixar em uma melodia bonita. Ser suas músicas favoritas e vê-lo resgatar-me das suas memórias diariamente no chuveiro, no caminho para a escola ou na praia. Vê-lo irritar-se profundamente por não lembrar de um dos meus versos. Eu queria ter sido seu primeiro banho de mar! E ter impedido suas quedas de árvores e tropeções vergonhosos. Quem dera eu fosse a consciência que te impedisse de errar ou caminhar para o arrependimento. Fosse eu o vento que levou sua primeira lágrima de amor ou a areia riscada com o seu nome. Eu queria ter sido o seu primeiro carnaval e a sua primeira oração de fé. Que convocasse meu espírito no agradecimento e no desespero, que eu fosse fonte de esperança e calmaria, sua maior alegria. Gostaria tanto de ser o impulso que precisa para os seus sonhos, qualquer coisa que desencadeia um sorriso seu. Eu gostaria de ser o tempo que te envolve.

A sensação, meu bem, é a de que o mundo não sabe cuidar de você como eu saberia. E a certeza, querido, é a de que eu estragaria a pessoa que, hoje, eu amo. Por não saber como negar-te seus desejos ou apresentá-lo à solidão, moldaria você de um jeito genérico. Por tanto, não sou nada disso. Abro mão do meu querer pelo seu ser e sigo assim, sendo aquilo que me cabe. 

Devolvo você ao mundo da mesma forma que o roubei para encaixá-lo nos meus devaneios. Por não caber, peço que siga suas pedras. Você sabe ser você melhor do que eu. 

Vou sobreviver.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Pelo fim da ditadura dos opostos.


Vamos ser radicais: Não há nada nesse mundo que me convença a atração dos opostos, e quando falo em opostos é para ser literal: Não pode só não curtir algo do outro, mas tolerar, tem que não gostar MESMO. Absolutamente nada me convence que a menina que é super caseira, ama filmes de comédia e ouve Maria Gadú para varrer o quarto permanecerá por muito tempo com um funkeiro, farinha de festa e adepto ao beber até cair. 

O amor que se constrói entre duas pessoas pode, no início, até fazer a bailarina cair de amores pelo DJ de raves, mas eu bato aposta: não vai durar. E eu vou te dizer o motivo: o ser humano é construído em cima de uma base muito frágil, conhecida como INSEGURANÇA, e quando a gente se percebe não sendo o modelo de pessoa que a gente acha que aquela pessoa gostaria de ter, quando a gente percebe que não se encaixa em nada da vida dele, é essa base que nos acorda para as possibilidades.

Só há duas justificativas, na minha opinião, para explicar quando dois opostos dão "certo": eles não eram tão opostos assim ou, pelo menos, não conheciam outras opções e, ao conhecer, gostaram, portanto... Não eram opostos, apenas distraídos. A segunda opção para desvendar a permanência duradoura de dois opostos em uma vida amorosa provavelmente está ligada ao fato de algum dos dois estar anulado na relação, o que já profetiza um fim.

Se você olha para quem está do seu lado e pensa: "isso não vai dar certo", provavelmente não dará. É besteira achar que você conseguirá, da noite para o dia, trocar sua Katy Perry pelo Caetano Veloso dele, a não ser que você, de fato, simpatize. 

O nosso oposto, logo de antemão, já representa o que não queremos ser e não o que não pensamos em ser, pois, no segundo caso, há uma falta de interesse que pode ser revertida. Eu amo os animais e alguém que maltrata eles nunca me atrairia. É com esse nível de oposição que estamos lidando. 

Aí você se arrisca, quer insistir na relação com o seu contrário e, logo ali na frente, encontra uma encruzilhada: deixar de ser quem é, para trilhar o caminho do outro, se anulando, ou soltar a mão dessa relação que não era nem para ter iniciado. Digamos que você é louca e opta pela primeira opção. Sabe o que vai acontecer? Lá na frente você vai ser invadida constantemente por uma sensação de não-encaixe que você nem saberá de onde veio e isso vai consumir seus pensamentos, suas ações e sua energia. Você vai se perceber tentando, ao máximo, ser o projeto de mulher ideal para ele que não é o homem ideal para você. E quando isso dará certo? Nos meus cálculos, nunca. É como uma cenoura que tenta ser a melhor maçã para um tomate que pensa ser um hambúrguer. TUDO sai do eixo, pois não há coerência e você, provavelmente, está perdendo seu tempo com alguém que está acomodado em ser ele mesmo.

A graça de um relacionamento saudável sempre girou em torno das descobertas. "Hum... Ele é espírita e eu, católica, mas sempre tive curiosidade. Acho que vou acompanhá-lo em um centro." Olha que bacana, novas experiências! Agora o "Hum... Ele passa o dia inteiro trancado dentro de casa, na frente de um videogame e eu me sinto péssima! Mas ainda que eu ame o ar livre e tenha planejado viver em uma casa nas montanhas, acho que posso me esforçar para mudar o que eu gosto." é caixão e vela, fia.

Ninguém consegue sustentar a auto-estima no alto se não conseguir ser o que ele nasceu para ser. Todos temos inclinações e, mais cedo ou mais tarde, acharemos pessoas com gostos e atitudes parecidas com as nossas para uma convivência leve e harmoniosa. Isso serve para amigos, também. Relacionar-se não é para opostos, pois relação é uma troca e a gente não sai no lucro quando trocamos o que amamos por algo que não nos representa.

Portanto, se você se apaixonar por um suposto oposto, procure nele suas semelhanças. Se achar, bingo! Se não achar, meu bem, dê meia volta. Gastar tempo e oração com alguém que nunca vai ser o que você quer que ele seja -  e ele tá certo! - é maluquice. O grande prazer da vida é assumir nossas vontades! E isso serve para você e para ele! ;)



sexta-feira, 7 de junho de 2013

Não se faz mais pessoas como antigamente


Há mentirosos, caminhada fatal na calada da noite, faca na mão de primogênito, olho na herança. Há agressores, ameaçadores doídos por uma nota baixa que ele mesmo tirou, jogadores de cadeira e destruidores de futuro. Há ausentes de responsabilidades, pessoas sem tempo para nada, geradores de filhos criados por babá. Há falsos sorrisos, abraços fracos, ligações perdidas e sensação constante de solidão. Há um reflexo distorcido do que você acha que deveria ser, frustração fabricada, insegurança e auto-estima rasteira. Há corpos desesperados por uma atenção duvidosa, donos de um movimento falso-feminista equivocado, perdidos. Há um rebanho seguindo um péssimo hábito de cultivo intenso ao corpo e desgaste cognitivo natural, portadores de um peitoral enorme que só guarda reflexões instantâneas, cada vez mais fasttalkHá socos e pontapés. Términos por falta de interesse na solução, preguiça e alta rotação. Há fotos no facebook, cobranças no whatsapp e nenhuma interação cara-a-cara que faça reconhecer aqueles dois nas declarações profundas da internet. Há crianças agindo como adultos e adultos com temores infantis. Há quem grite apoio por causas animais. Só. Há quem levante a bandeira do "bem feito" ao presenciar a justiça sendo feita pelas mãos de um outro. Há quem se compara, inconscientemente, ao acusado no segundo que sente prazer ao vê-lo sofrer. Há quem não acredite nos Direitos Humanos. Há psicopatas sociais sentados ao seu lado. Há mentiras brancas, tapa-olho e hipocrisia. Há quem curte o fingimento, atualiza diariamente suas ilusões e mente para si mesma. Há insatisfações patológicas, agressões verbais gratuitas e apologia ao bullying. Há quem acha uma bobagem essa coisa toda ao redor dos menores infratores. Há gente com cansaço para mudar de opinião, regendo o mundo através de empurrões ignorantes, reflexo de sua vivência rasa. Há muita indignação, descrença no outro, mortes rápidas, sentimentos efêmeros. 

Há tanta saudade.

Há saudade de um carinho amoroso, falta do olhar de um bichinho de estimação, da certeza de que podemos confiar. Há saudade de ruas mais tranquilas, de problemas mais distantes e gente de verdade. Há saudade da verdade. Há saudade das festas no playground e das gincanas no colégio. Há saudade do colégio que era, realmente, a segunda casa. Há saudade dos porteiros e das aulas de educação física. Há saudade da formatura e da infância. Há saudade de ir em frente. Há saudade de não ter medo. Há saudade de quando todo mundo era mais presente, da piscina e do peixe frito nas praias. Há saudade de quando todo mundo se amava muito, se preocupava com os outros e TAMBÉM com os animais. Há saudade de quando sem maquiagem era bonito e ninguém sabia se maquiar. Há saudade de quem se foi, mas ainda permanece. Há saudade de quando pai e mãe era respeitado e fazia jus a esse respeito. Há saudade de quando havia mais fé. Há saudade da leveza.

Que planeta adoecido esse que vivemos. Eu sou, muitas vezes, objeto de repúdio para mim mesma quando me percebo caindo na armadilha desses maus pensamentos. E me sinto, quase sempre, uma estranha no meio de tantas pessoas conformadas. Mas não posso deixar que o patológico se torne algo natural e vou persistir no meu pequeno território. Onde eu piso há muita reflexão. Onde eu caminho há muitos arrependimentos e pequenos concertos. Onde eu ando não é permitido auto-ofensas e "pensar melhor" é sempre o melhor trajeto a ser seguido. Onde eu estou há pausas. Às vezes, há rancor. Mas há, mais ainda, muitas chances.

Há tanta esperança...


Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...